‘O Tribunal tomará medidas’, diz presidente do TJCE sobre juiz que ofendeu vítimas de crimes sexuais
O presidente do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), desembargador Abelardo Benevides Moraes, disse à imprensa que o ‘Tribunal tomará as medidas adequadas’, se referindo às falas em audiência do juiz Francisco José Mazza Siqueira, divulgadas pelo Diário do Nordeste.
Por nota, o TJ afirmou que a Corregedoria-Geral da Justiça do Ceará abriu “sindicância para apurar os fatos relacionados à atuação de juiz. A decisão constará em portaria que será publicada no Diário da Justiça de hoje. Além disso, o caso está sendo analisado pelo órgão correcional para avaliação de aplicação de outras medidas cabíveis”.
Ainda na tarde desta segunda-feira (7), dia em que o TJCE recebe a ‘Jornada Lei Maria da Penha’, o desembargador foi questionado pela imprensa acerca da atitude tomada por Francisco Mazza enquanto ouvia vítimas e depoentes de crimes sexuais, na região do Cariri, Interior do Ceará.
“Eu não estou aqui pré-julgando esse caso. Tomei conhecimento desse fato hoje bem cedo, me passaram antes das 7 da manhã. Passei para a nossa corregedora que trata dessa matéria, que está cuidando disso. O Tribunal nos próximos dias tomará as medidas adequadas”, disse Abelardo Benevides.
“A corregedora não sabia ainda. O Tribunal nas próximas horas, com equilíbrio, com parcimônia, com a visão de pessoas que têm responsabilidade, irá tomar medida apropriada. A corregedora pode tomar imediatamente qualquer medida, como abrir sindicância e apresentar ao Tribunal para chancelar ou não”. PRESIDENTE DO TJCE.
O presidente do Poder Judiciário estadual falou ainda que “em todas as instituições têm pessoas que desbordam das suas atribuições” e que “nós temos 474 magistrados no Estado do Ceará. Um ou outro, mais cedo ou mais tarde, até por falta de qualificação em todos os sentidos, emocional, vocacional…”.
‘QUEM ACHA QUE MULHER É BOAZINHA?’
No último dia 26 de julho, 10 mulheres estavam no Fórum de Juazeiro do Norte, Interior do Ceará, prontas para participarem da audiência da ação cível com pedido de indenização a partir dos crimes sexuais cometidos por um médico. Foi um ano e meio de espera até que o juiz as chamassem para ser ouvidas. Em poucas horas, a sessão se “tornou um circo de horrores”.
Das 9h às 13h, as mulheres estiveram na presença do juiz Francisco José Mazza Siqueira. O que elas não esperavam era, naquele momento de ‘vulnerabilidade’, ser revitimizadas, desta vez, segundo denunciantes, pelo próprio magistrado.
Em determinado momento da sessão, uma das depoentes ouviu o magistrado dizer: “tinha aluna que chegava se esfregando em mim…esfregando a vagina em mim… aqui não tem criança, aqui é todo mundo adulto… e dizia professor não sei o que… E eu dizia: minha filha é o seguinte: quando eu deixar de ser seu professor, você faça isso aqui comigo”.
Na última semana, quando questionado sobre as denúncias, o TJCE disse que “não tomou ciência, até o momento, de qualquer reclamação disciplinar para apurar os fatos narrados. Todas as denúncias ou reclamações relacionadas à atuação de juízes, submetidas à Corregedoria-Geral da Justiça, são devidamente apuradas”.
Já a Associação Cearense de Magistrados (ACM) afirma “que repudia quaisquer ações misóginas ou condescendentes com assédio sexual e/ou moral de gênero” e “considera, contudo, não ser prudente, nem oportuno, desde logo, imputar responsabilidade ao magistrado, sem análise de todo o contexto da situação apontada e antes mesmo de uma eventual apuração de sua conduta funcional pelos órgãos competentes, especialmente em razão da absoluta excepcionalidade do que restou noticiado”.
A ACM diz ainda esperar “que o episódio seja devidamente esclarecido, em resguardo aos interesses das pessoas envolvidas e da própria Instituição da qual faz parte o magistrado”.
‘DEPOENTES QUISERAM DESISTIR DA AÇÃO’
Aécio Mota, advogado das vítimas, diz que a audiência “mais pareceu um circo de horrores”. A acusação acredita que o “juiz desdenhou do comportamento das mulheres” e não se espantou quando terminada a sessão, “depoentes quiseram desistir da ação”.
“Na audiência, em vários momentos o juiz menosprezou o comportamento das mulheres nos dias atuais, insinuando que as mulheres atualmente também são culpadas pelo comportamento de homens abusivos. Esbanjou machismo e desdenhando das vítimas de violências sexuais. O que se mostrou em audiência foi um total desrespeito e desconsideração de todo o trauma causado pelas violências que aquelas mulheres já tinham sofrido, principalmente por um Juiz, que deveria se referir de maneira respeitosa àqueles presentes na audiência”, disse Aécio Mota.
Diário do Nordeste